A depressão se tornou uma das psicopatologias mais presentes no cotidiano das pessoas. Cada vez mais estudada e conhecida, ela se tornou a doença mental mais conhecida da atualidade. A depressão possui uma sintomatologia bem característica, que vai de humor depressivo na maior parte do dia a comportamentos autolesivos até a tentativas de suicídio. Mas você sabia que além dos sintomas comportamentais, uma pessoa com depressão pode também apresentar prejuízos nas habilidades cognitivas, como atenção, memória e tomada de decisão?

Então me acompanha.

Depressão e o cérebro

Além dos sintomas comportamentais e emocionais diretamente relacionados com a depressão, algumas habilidades cognitivas são prejudicadas pelo quadro depressivo, como a atenção, a memória, as funções executivas e a tomada de decisão.

Isso acontece porque a doença tende a diminuir os neurotransmissores no cérebro, e por consequência, a estimulação e a efetividade das habilidades cognitivas. De maneira geral, o cérebro funciona de forma diferente, mais lento, ao que normalmente se vê em pessoas sem o quadro depressivo. Não estamos falando de lentidão do impulso nervoso em si, mas de uma diminuição das sinapses entre os neurônios.

Atenção

Não se sabe exatamente a causa da relação da perda de atenção com os quadros depressivos. O que se sabe é que, de fato, existe uma correlação entre ambos. Pessoas que possuem depressão ou transtorno bipolar apresentam dificuldades em concentração, independentemente da idade.

Alguns antidepressivos ainda podem apresentar efeitos adversos que também podem influenciar nas habilidades cognitivas, mais especificamente na atenção sustentada, dificultando a realização de uma tarefa um pouco mais longa.

Memória

Quando falamos de perda de memória, precisamos entender que a memória apresenta três etapas: aquisição, armazenamento e evocação.

Problemas de atenção influenciam diretamente na etapa de aquisição da memória, quando tentamos captá-la. Com baixo foco atencional, a informação não permanece por muito tempo. É o popular “entrou por um lado e saiu pelo outro”.

Já na etapa de armazenamento, que é efetivamente o arquivamento das informações, como um armário, pacientes com quadros depressivos também podem apresentar dificuldades.

Um estudo em 2013 indicou que pessoas com quadro depressivo apresentaram maiores dificuldades em identificar objetos idênticos aos que haviam visto previamente. Um outro estudo em 2015 indicou perdas na memória de curto prazo.

Funções executivas

As funções executivas são habilidades cognitivas relativamente novas na neuropsicologia. Ilustrada como um maestro em uma orquestra, as funções executivas são as responsáveis pela organização das demais habilidades cognitivas e sensoriais, de maneira organizada, para a execução de uma tarefa consciente.

Dificuldades nas funções executivas podem aparecer como dificuldades em pagar as contas ou retornar uma ligação. Percebe que as funções executivas nesses dois exemplos utilizam a memória? Pois é! Tudo está interligado.

Além disso, perdas nas funções executivas podem proporcionar dificuldades na autorregulação do comportamento, um componente recentemente identificado como pertencente às funções executivas. O fato da pessoa não se perceber daquela forma também reforça essa ideia de perda cognitiva.

Ainda nas funções executivas, as habilidades de tomadas de decisão, relacionadas também com velocidade de processamento e raciocínio lógico são prejudicadas.

A avaliação neuropsicológica de pacientes com depressão

A pergunta que fica é: Eu como um avaliador, consigo avaliar uma pessoa em um quadro depressivo, onde as habilidades cognitivas estão prejudicadas:

A resposta é sim e não.

Sim porque é possível realizar a avaliação, se os resultados forem relativizados e contextualizados à situação da pessoa.

Mas também não porque esses resultados não vão demonstrar as habilidades reais em referência à população geral.

Em uma avaliação, comparamos os resultados obtidos com as médias estatísticas da população (dados nomotéticos) e também os seus resultados com ele mesmo (dados idiográficos).

Nesta avaliação os dados idiográficos seriam suficientes, mas os nomotéticos ficariam seriamente prejudicados.

Eu sei, seu sei, já acabou a aulinha de psicometria!

Em consultório, quando alguém me procura para fazer avaliação neuropsicológica e eu detecto um possível quadro depressivo, e não há uma recomendação médica ou de outro profissional que mostre a importância da avaliação, eu encaminho diretamente para psicoterapia e para o psiquiatra, e peço pra voltar quando estiver melhor. Pacientes com quadros depressivos demandam intervenção imediata, e a avaliação neuropsicológica leva tempo.

A depressão é coisa séria!

Escrevi esse texto hoje para mostrar como a depressão é uma doença muito séria e perigosa, que vai aos poucos derrubando as pessoas. E não apenas nas questões comportamentais e emocionais, a depressão prejudica as habilidades cognitivas.

Então faço aqui a pergunta: Você já fez psicoterapia hoje?